Os temas da logística reversa e da gestão de resíduos sólidos fazem parte hoje da agenda empresarial de todo o mundo. E é por isso que a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) incluiu o assunto em sua carteira de projetos. Segundo o presidente da Agência, Igor Calvet, a economia circular é hoje um fator de competitividade, de reputação e de comércio.
“A gestão em economia circular traz reflexos importantes tanto do ponto de vista ambiental quanto reputacional e comercial para as empresas”, disse ele durante sua participação no painel “Desafios do Brasil em Logística Reversa” no evento Circular Summit 2021, nesta quarta-feira (11). “Por tudo isso, as empresas têm tido a necessidade de reformular seus processos, seus planos e seus negócios com base na circularidade”, afirmou.
Promovida pela Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), a conferência, que termina amanhã, tem o objetivo de inspirar líderes e empresas de todos os setores a promover modelos de negócios mais sustentáveis, que caminhem em direção ao novo modelo econômico circular.
Para o presidente da ABDI, a alteração drástica nas relações de consumo e de produção é hoje o principal impulsionador da Economia Circular. “Os consumidores estão exigindo cada vez mais rastreamento e maior degradabilidade dos produtos, e os produtores estão se adequando a esses novos padrões de consumo em seus processos produtivos que, em vez de processos lineares, tendem, com razão, a se tornarem processos circulares”, explicou.
Calvet ressaltou ainda a importância de mudanças do ponto de vista regulatório e tributário. “Precisamos estar muito focados numa convergência de agenda entre os setores público e privado do ponto de vista regulatório e tributário para que os modelos de negócios sejam ambientalmente corretos e economicamente viáveis, sem o qual não conseguiremos dar um salto de competitividade nas ações das nossas indústrias no presente e no futuro”.
Além do presidente da ABDI, estiveram presentes no Painel a diretora-presidente da CETESB, Patricia Iglecias; o diretor Comercial da Estre Ambiental, Antonio Januzi; e o gerente de Projetos da Veolia Brasil, Christophe Bonaldi.
Projeto da ABDI e da Abiplast
Um modelo de gestão de resíduos sólidos que seja sustentável com uma destinação final ambientalmente adequada e que também gere aumento de recicláveis com potencial econômico é um desafio complexo. Ainda mais em um país de proporções continentais como o Brasil, que gera 80 milhões de toneladas de resíduos por ano e ainda conta com 2.408 aterros e lixões recebendo resíduos. Atenta a esse panorama, a ABDI, em conjunto com a Abiplast, elaborou um modelo de gestão de resíduos sólidos urbanos (RSU).
Antes de elaborar a modelagem, os técnicos envolvidos no estudo realizaram um benchmarking em localidades em que os modelos e experiências de logística reversa estão funcionando. O benchmarking mostrou que as cidades de Parma, na Itália; Barcelona, na Espanha; e Cidade do México, no México, são as experiências que mais deram certo e inspiraram o modelo de gestão proposto no projeto.
A modelagem para a primeira localidade, Barueri (SP), está pronta e servirá de piloto para implementação do projeto em outros municípios semelhantes. Com população de cerca de 280 mil habitantes, e 80 mil domicílios, Barueri é o município mais rico do país. Com produção de cerca de 96 mil toneladas de RSU por ano, provenientes tanto da coleta comum quanto da seletiva, e com 30.6 mil toneladas potencialmente recicláveis, o município recupera cerca de 11.3 mil toneladas.
As outras duas localidades serão Guarulhos e Cajamar, também no estado de São Paulo. Guarulhos é um grande município com complexidades de uma cidade grande, não tem 100% de coleta seletiva e alto índice de informalidade do sistema de triagem de resíduos, baixo engajamento social e baixo investimento por parte do poder público e da iniciativa privada. A outra cidade é Cajamar, que não tem coleta seletiva.
O modelo proposto pela ABDI se apoia em quatro diretrizes básicas: a responsabilidade compartilhada, com o envolvimento de todos os elos do setor; a definição clara da responsabilidade de cada ator; o condicionando do licenciamento ambiental e alvará de funcionamento ao cumprimento de planos de logística reversa por parte do varejo (porque a indústria já é obrigada a fazer isso); e a implantação de uma taxa de coleta e tratamento de resíduos.
Além disso, o modelo enfatiza a necessidade de se implementar ações de educação ambiental para envolver a população nesse processo. “O cidadão é o elo mais importante de toda a cadeia da gestão de resíduos sólidos urbanos. Usar as tecnologias de informação e comunicação é fundamental para ensiná-lo a fazer a separação correta, de forma a minimizar a contaminação; informar dias e rotas de coleta seletiva e a localização dos Pontos de Entrega Voluntária (PEVs); eventos; premiações; e dar feedbacks sobre como ele está separando seus resíduos”, explica a analista de Produtividade e Inovação da ABDI, Talita Daher, uma das responsáveis pelo estudo.
De acordo com Talita, a população precisa dessa conscientização, não só por conta da separação correta, mas também para pressionar e mobilizar os demais atores envolvidos na cadeia, como governo e entidades privadas. “Síndicos e administradores de condomínios, por exemplo, são multiplicadores. Ações específicas para esses públicos podem aumentar, e muito, a separação adequada dos resíduos”, indica.
Outro elo bastante importante da cadeia, o catador, precisa de investimentos em sua profissionalização, aponta o estudo. O modelo destaca que é necessário promover a inclusão social de catadores individuais e de cooperados, revendo aspectos trabalhistas de sua remuneração e de suas condições de trabalho. Para isso é importante proporcionar meios para a requalificação desses profissionais. Segundo o documento, uma forma possível de viabilizar essa ação seria o uso de parcerias com o sistema S.
A tecnologia também é uma grande aliada na promoção da sustentabilidade. No estudo, a aplicação de recursos tecnológicos é uma das ações para otimizar a jornada dos resíduos sólidos urbanos. Plataformas digitais podem melhorar a rastreabilidade dos resíduos desde a sua disposição pelo cidadão até o aproveitamento desses materiais como recicláveis. Aliadas a tecnologias embarcadas, como sistemas de georreferência, códigos de barra e sensores, as plataformas podem fornecer dados para analisar a eficiência e a melhoria do modelo ao longo do tempo. Além disso, com essas informações, a gestão do sistema consegue perceber os gargalos que precisam de intervenção em cada elo da cadeia.