O que leva uma grande empresa a buscar inteligência externa na hora de inovar? E o que uma startup pode fazer para "chegar junto" e vender seu produto ou solução? Esses e outros questionamentos foram o ponto central do bate-papo entre os heads da Totvs, Bradesco e Samsung, e o CEO da startup Pluvi.On, na tarde da sexta-feira (15), em um dos palcos da Campus Party Brasil 2019.
O executivo Juliano Seabra, diretor do iDexo e head de Inovação e Novos Negócios da Totvs, lembrou que as novas tecnologias obrigam as corporações a serem muito ágeis, o que acaba estimulando que busquem inovação fora de casa. "Eu brinco que, de um lado você tem a startup, uma moto potente, correndo a 120km/h, sem capacete. Daí, você não sabe se no final do mês, ela vai fazer a curva ou se vai bater no muro”, comparou. “Do outro lado, você tem a companhia, mais lenta, burocrática, mas que tem uma plataforma de clientes gigantesca”, acrescentou.
Segundo Seabra, foi nesse cenário que a Totvs criou o iDexo, uma instituição sem fins lucrativos com a missão de fazer a conexão entre uma oportunidade de negócios dentro da empresa e uma solução que pode ser desenvolvida por uma startup. “Fazemos não só o network, mas principalmente o esforço de mentoria dessa startup, atuando como broker entre a startup e as diversas áreas da Totvs", ressaltou, ao lembrar que a companhia conta com 32 mil clientes, entre pequenas, médias e grandes empresas, ou seja, "ao ser selecionada, a startup conta com uma cauda longa de clientes".
Para o head do programa InovaBra, do Bradesco, Francisco Venâncio, a grande vantagem da conexão é a oportunidade de a startup "navegar em uma estrutura com nível de governança necessário para uma empresa que teve um lucro, no ano passado, de R$ 21,5 bilhões". “É um mundo que se abre. A gente coloca a startup em contato com o pessoal do jurídico, compliance, tecnologia, segurança corporativa, lógica. É uma grande troca de experiência e crescimento para ambos", destacou, acrescentando que "depois de passar pelo InovaBra, tem startup que atingiu um crescimento, em média, de 300%, inclusive com a abertura de operações na Colômbia, México e Estados Unidos.
Comoção
O maior desafio de conexão entre empresas nascentes de base tecnológica e grandes indústrias está na sensibilização "dentro de casa”, definiu Paulo Quirino, coordenador Nacional do programa Creative Startups, da área de Pesquisa & Desenvolvimento da Samsung.
"Quando iniciamos nossa jornada, tivemos de criar toda uma comoção dentro da companhia. Começamos mobilizando os profissionais seniores da Samsung e pedimos que estruturassem projetos de aceleração de produtos”, relatou. Desta forma, lembrou Quirino, a área de Inovação começou a mudar a cultura interna da empresa. “Trouxemos o departamento de Design Thinking e de Vendas para dentro do projeto. Perguntamos à área de Vendas o que eles queriam. Daí, ele escolhia um produto e a gente começava a monitorá-lo a partir da conexão com soluções de startups", disse.
E o resultado? “Hoje eu consigo mensurar o quanto uma solução de startup melhora os resultados de um time de vendas. Se eu interromper contratos com startups, vou impactar negativamente uma série de áreas dentro da empresa", frisou o executivo da Samsung. Para ele, “não é o time de inovação que tem que aparecer. Nós apenas levantamos a bola. Quem dá o corte é a área de vendas", comparou.
Tempo, senhor do sucesso
Em 2016, quando pensou em criar a Pluvi.On, uma startup de monitoramento climático, com previsões acuradas e de baixo custo, o engenheiro de Produção, Diogo Tolezano, não sabia para qual direção iniciar sua jornada. Ao lado de mais quatro sócios, ele conta que o pontapé foi a crise hídrica no Estado de São Paulo. “No início era só uma ideia. Então, resolvemos estudar o tema da água e aprofundamos até a questão das enchentes e deslizamentos”, lembrou.
"A gente sempre achou que a previsão do tempo era muito pouco precisa. Faltavam dados e informações no mercado. Como a gente buscava um diferencial, decidimos criar nossa própria base de dados. Mas, como toda startup iniciante, o momento mais difícil foi conquistar a credibilidade dos investidores e dar o rumo certo para o desenvolvimento”, contou, ao lembrar que o time começou a jornada no mundo maker e, em seguida, conseguiu entrar no programa Red Bull Basement, sem contar com nenhum meteorologista no time.
Ali, montaram um projeto piloto na região da Lapa, que acabou chamando a atenção de grandes empresas. “Nosso segundo desafio, foi sair do MVP (Minimum Viable Product) e começar a escalar. Ao contrário de outras startups, ainda tínhamos o desafio de criar um hardware (estação meteorológica) e buscamos parceria com o CPqD, de Campinas, e do fundo Embrapii, do MCTIC”, contou, ao falar da importância de terem passado por projetos de aceleração do Google, Facebook, Artemisia e outros.
O maior salto chegou em 2017, depois da parceria firmada com a Icatel, empresa de telecomunicações especializada na instalação e manutenção de telefones públicos por todo o país. “Com eles, trocamos uma vasta experiência para o melhor posicionamento das estações e criamos um modelo melhor de estação de monitoramento”, afirmou.
Hoje, depois de muitas "tempestades", de procurar prefeituras, empresas e investidores, de ter ouvido vários "nãos" ao longo da jornada, a Pluvi.On instalou a primeira estação em setembro de 2018 e já conta com mais de 130 estações espalhadas no país. “Nosso objetivo é alcançarmos mais de 1000 unidades instaladas até o fim deste ano", adiantou, ao mencionar que a startup atende diversas empresas, com foco no B2B (empresa-empresa), nos setores da agricultura, transportes, engenharia e energia. A startup faturou R$ 60 mil em 2017, mas pretende romper a barreira dos R$ 10 milhões até 2022.
Reconhecidos pela ONU
Especializada no alerta preciso de deslizamentos e enchentes, por meio do uso de estações de monitoramento de baixo custo, utilizando tecnologias de Internet das Coisas (IoT, Internet of Things), a Pluvi.On garante o acompanhamento preciso e ininterrupto do clima e, principalmente, o alerta à população em tempo real. E tamanha inovação com impacto social chamou a atenção da Organização das Nações Unidas (ONU).
O time foi convidado a participar, na Áustria, de um evento da ONU como case de sucesso. "Somos a primeira startup no mundo e primeira empresa brasileira a ser convidada pela ONU para participar da plataforma global de cidades inteligentes. Nossa tecnologia pode ajudar as empresas a reduzir as perdas e, sobretudo, a salvar vidas", finalizou o CEO, Diogo Tolezano. Eventos de catástrofes, como enchentes e deslizamentos, afetam mais de 30 milhões de brasileiros, com perdas de mais de R$ 10 bilhões por ano, cita o empreendedor. Um caso recente que poderia ser evitado foram as sete vítimas das fortes chuvas que afetaram o Rio de Janeiro, no início de fevereiro.
Quotes
"Conectar com grandes companhias é garantir oportunidades de negócio com empresas com caudas longas. Nós entregamos valor para as empresas e para as startups, que passam a gerar nota fiscal. Queremos construir uma relação que garanta ritmo de crescimento para ambos os lados." Juliano Seabra, head de Inovação da Totvs.
"Hoje, se interrompermos nossos projetos com startups, vou gerar impacto negativo em vários departamentos que dependem dessas soluções, seja para gerar mais faturamento, para acessar o mercado ou para reduzir o custo garantido por infinitas soluções criadas por elas." Paulo Querino, coordenador Nacional do programa Creative Startups, da Samsung.
"Colocar as startups em contato com a área de tecnologia, compliance, jurídico, compras, lógica, segurança corporativa garante uma troca de experiências infinita para ambos os lados. Temos startups que experimentaram um crescimento de mais de 300% depois do programa.” Franciso Venâncio, head do InovaBra.
"Conectar com uma grande empresa nos trouxe uma expertise que não tínhamos. Mas vejo que ainda há companhias que só estão no hype, mas são pouco preparadas para esse relacionamento com as startups. A empresa não pode olhar a startup como fornecedora, onde ela é esmagada no preço ou no prazo. Ela tem de ser vista como um instrumento de inovação." Diogo Tolezano, CEO da Pluvi.On.