A miniaturização de componentes tem qualificado produtos e vem trazendo bons rendimentos para a indústria. As nanopartículas já compõem diversos produtos, como roupas, cosméticos e calçados. O mercado mundial do setor é gigante. Segundo estimativa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a nanotecnologia deve movimentar R$ 9 trilhões ao redor do planeta em 2018. O valor é uma vez e meia superior ao PIB brasileiro de 2017, que ficou em R$ 6 trilhões (segundo o IBGE).
Mas como a introdução de nanopartículas se traduz em rendimentos? Um dos fatores é o ganho de escala. A especialista da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Cleila Pimenta, explica que na indústria cosmética estão fazendo mais com menos. “Protetores solares, por exemplo, usam como base o dióxido de titânio, que no modelo convencional tem baixa espalhabilidade. Quando transformado em nanoescala, utiliza-se menos matéria-prima, aumentando a eficiência do produto. É como se ficasse uma película transparente sobre a pele”, ilustra a especialista. O benefício para a indústria é menos gastos com insumos, e para o consumidor mais eficiência do produto. Na prática, ele protege mais contra os raios ultravioleta.
Além da escala, outro ponto levantado pelos empresários que utilizam nanotecnologia é a qualificação dos produtos. A Dublauto, criada para fabricar componentes de calçados, usou a tecnologia para promover uma virada nos negócios. A indústria gaúcha de Ivoti, em 2005, começou a procurar novas áreas para investimento devido à entrada de competição chinesa no mercado. “Para continuarmos competitivos, tínhamos que aumentar a escala ou qualificar os componentes do calçado. Depois de avaliar a questão, o ganho de escala era uma medida impossível para o tamanho da fábrica, então começamos a pesquisar experiências internacionais para agregar valor”, explica o diretor industrial da empresa, Evandro Wolfart.
A empresa fez incursões aos Estados Unidos, China e Europa. Na Alemanha, a Dublauto teve contato com a nanotecnologia. A fábrica introduziu nanopartículas de prata no tecido de revestimento das palmilhas, criando assim um produto que inibe o odor. “Nós tivemos que adaptar nosso maquinário, mas os resultados foram ótimos. Atualmente, estamos abrindo outra empresa especializada em nano, que está desenvolvendo tecidos para roupas e um plástico com propriedades curativas”.
Apesar de rentável, a nanotecnologia ainda é uma inovação relativamente pouco utilizada pelas indústrias brasileiras. Na Pesquisa de Inovação Tecnológica de 2014, realizada pelo IBGE, observa-se que apenas 1,8% das empresas inovadoras brasileiras usavam nanotecnologia.
Espalhando a nanotecnologia
Para incentivar a capilarização da técnica, a ABDI e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) iniciaram um projeto piloto em 2017. As entidades estão realizando rodadas tecnológicas setoriais e eventos de sensibilização. “O primeiro passo é saber quais as necessidades da indústria que podem ser resolvidas com nanotecnologia. Em um segundo momento, vamos selecionar três empresas, de forma piloto, para fazer um diagnóstico sobre como a nano poderia melhorar a competitividade das empresas. Vamos identificar quais as oportunidades de mercado envolvendo a tecnologia”, explica Cleila Pimenta. Além disso, estão sendo realizados seminários em todo o país para apresentar a nanotecnologia.
Para auxiliar a indústria, já existe uma rede de laboratórios especializados. O Sisnano (Sistema Nacional de Laboratórios de Nanotecnologia) é composto por 26 centros de pesquisa. Cada laboratório participante deve estar disponível para desenvolvimento de nanotecnologia para a indústria. A maioria dos centros está localizada na região Sudeste?—?dez em São Paulo, cinco no Rio de Janeiro e três em Minas Gerais. Na região Sul estão outros quatro?—?dois no Paraná, um em Santa Catarina e um no Rio Grande do Sul. Encerram a lista Pernambuco, com dois, Ceará e Pará, com um cada. “A rede de laboratórios auxilia as indústrias. Com auxilio técnico, através de parcerias, as indústrias não precisam investir pesado para trabalhar com nano”, defende a especialista da ABDI.
O professor de física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), João Jornada, corrobora. Segundo ele, além de parcerias com centros técnicos é possível comprar nano como uma espécie de commodity. “Se você quiser fazer insumos nanotecnológicos, como pós e fibras, precisa de muita pesquisa. Mas se eu sou um fabricante de tintas, por exemplo, e quero melhorar meu produto, já é possível adquirir no mercado componentes nano que vão me ajudar nisso”. Ou seja, a indústria pode comprar os componentes prontos e adicionar na composição do seu produto, aumentando assim resistência ou tornando-o mais leve. “A nanotecnologia já está madura do ponto de vista científico e os resultados são reais. É muito interessante como as propriedades dos materiais se alteram com a diminuição da escala”.
Financiamento
Para as indústrias que quiserem investir na área, existem diferentes linhas de financiamento no Brasil. Segundo o gerente de inovação da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), Marcelo Nicolas, as indústrias precisam pensar em cinco fatores antes de implementar a nanotecnologia e conquistar financiamento: risco, abrangência, barreiras, impacto e externalidades. “Além dos riscos e abrangência, o empresário precisa pensar sobre quem aquela inovação vai atingir, projetando os reflexos no mercado. Quando você traz uma tecnologia inovadora para o mercado, existem efeitos tanto para o consumidor, como para a concorrência. Pensar e projetar isso é fundamental”. A Finep disponibiliza para indústrias de todos os setores financiamentos de R$ 150 mil a R$ 10 milhões de reais, voltados para nano.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) também financia as pesquisas do setor. Fernão de Souza Vale, integrante da equipe do Banco, explica que são duas modalidades de financiamento. “Há diretos e indiretos. O direto é a partir de R$ 10 milhões, voltado para grandes empresas, então a maioria vai acabar na linha indireta, que é disponibilizada por instituições parceiras”. O BNDES repassa o dinheiro para outros bancos que fazem a análise de crédito.
O campo da nanotecnologia ainda tem ampla possibilidade de crescimento no Brasil. Segundo a Pesquisa de Inovação Tecnológica do IBGE, havia apenas 975 empresas utilizando a técnica em 2014, sendo que a grande maioria (81,6%) é apenas usuária, não desenvolvedora. Mesmo que o número de empresas que atue de fato na pesquisa ainda seja pequeno, ele demonstra crescimento. Em 2011, 6,8% das empresas trabalhavam em pesquisa e desenvolvimento nano. Já os dados mais recentes, de 2014, apontam um índice de 15,3%?—?mais do que o dobro de empreendimentos que produzem soluções em nanotecnologia.